Estava aqui pensando como agradar meu parceiro Bugaboo. Logo me veio a cabeça forjar vários itens mágicos para lhe presentear, afinal, quem não gosta de itens mágicos? Aposto que até mesmo um bugbear ranzinza!
Então peguei meu livro de RPG e abri na seção “Criação de Itens Mágicos” e foi aí que tudo começou. Acho que o capítulo deveria se chamar “Como PDMs criam itens mágicos”….
Este artigo tem como objetivo questionar a regra de criação de itens mágicos, e sugerir algumas mudanças para melhor aplicá-la a sua mesa de jogo. Note que aqui abordo diretamente as regras usadas no D&D 3º edição e seus derivados, como Pathfinder, mas isso não significa que você não possa aproveitar os conceitos usados em outros sistemas. Já que a regra usual falha miseravelmente nesta tarefa, vejamos quais caminhos podemos seguir:
Jogadores querem criar itens mágicos?
Qualquer Mestre sabe responder essa! Se o processo for vantajoso, com personagens gastando menos ouro para construirem seus itens, é claro que os jogadores vão se interessar em fabricá-los. Se eles puderem criar um item personalizado então, vão adorar. E algumas vezes, somente algumas (SEMPRE rs), eles irão criar um item que tenta resolver algum aspecto do problema que enfrentam na campanha.
Mas e quanto as regras? Os sistemas oferecem boas regras para permitir que os próprios personagens criem parte de seus equipamentos?
Bom, a criação de itens mágicos sempre me pareceu nebulosa, desde do D&D ao AD&D, até que finalmente com a reformulação da terceira edição tentaram trazer uma regra mais sólida. Ainda assim, muita coisa nesta regra me incomoda:
A centralização dos “spellcasters” para criação de itens mágicos.
Em D&D, basicamente, você só cria itens se for um lançador de magias (na grande maioria das vezes arcano). Pior do que isso, inventaram que a maioria dos itens mágicos está associado a alguma magia, e assim para poder criar tal item, o personagem deve obrigatoriamente “ter” aquela magia.
A metodologia usada para criação dos itens.
A regra é completamente anti-jogo, obrigando o personagem a gastar as vezes muita experiência; as vezes muito tempo. Ela não parece ter sido feita para que jogadores e seus personagens usem fruto dela. A regra parece ter sido feita como algo para preencher uma lacuna. Algo como “se alguém perguntar como os itens são criados, a regra está lá para explicar”.
Regras feitas para PDMs.
Sem uso para as regras, os únicos personagens que as utilizam são os personagens do Mestre, que são aqueles que aparecem durante a aventura vendendo, consertando, ou de alguma forma envolvidos com itens mágicos. Isso porque tais regras obrigam um personagem a perder muito tempo para realizar o processo de criação, com uma série de mecânicas burocráticas (e desnecessárias).
É claro que tudo isso está diretamente conectado com o cenário que está sendo jogado. Em sua aventura, talvez itens mágicos sejam coisas únicas, seu processo de fabricação esteja perdido no tempo (similar ao D&D 5º edição) e realmente apenas os PDMs devem controlar tal conhecimento. Mas aqui estamos falando de aventuras de alta fantasia, aquelas repletas de magias e itens. E a grande maioria das aventuras de D&D 3º edição são assim. Chove item mágico!
D&D gira em torno de magia, mas eu sempre achei este conceito muito centralizado, principalmente para criação de itens mágicos. Eu nunca curti esse conceito, e desde a criação de Zênite, um sistema que surgiu baseado em AD&D e que logo foi adaptado também a terceira edição, busquei dar mais espaço para todos os tipos de personagem. Neste caso, falo de permitir que todos os personagens, independentemente da classe, pudessem criar itens mágicos. E deu muito certo!
As regras que impõem restrições, tanto foco nos personagens “spellcasters”é absurda, e limita demais uma mecânica que deveria ser interessante para todos. É decepcionante pensar que aquele ferreiro boladão não pode criar itens mágicos.
Então aqui compartilho com vocês um pouco da regra de criação de itens mágicos do antigo Zênite.
A proposta:
Qualquer um pode criar itens mágicos!
A criação de itens está disponível para todos, independentemente de classe, raça ou qualquer outra característica. Tudo que você precisa fazer é pagar os pré-requisitos necessários para que seu personagem conheça o processo.
Regra prática para que jogadores possam aproveitá-la!
É óbvio que o personagem não vai forjar um item do nada, mas com uma regra mais equilibrada, personagens podem criar seus próprios itens mágicos, de acordo com suas necessidades, mesmo quando estiverem se aventurando.
Conceito de criação de itens mágicos
Para criar itens mágicos o personagem precisa ter alguma afinidade mágica e o conhecimento necessário para tal. Isso é feito obtendo o Talento Criar Itens Mágicos, que permite o personagem criar qualquer tipo de item mágico. Não são necessários vários talentos para itens diferentes. Em outro sistema, você pode exigir que o jogador pague uma vantagem ou tenha uma perícia para indicar seu conhecimento na criação de itens.
No processo de criação, o personagem usa o que chamamos de matéria prima mágica, que são compostos capazes de tornar um objeto mágico através do processo correto. Em alguns casos, para itens especiais (e normalmente mais poderosos), o mestre pode determinar algum componente específico como matéria prima para sua criação (um chifre de unicórnio, por exemplo).De forma geral, o personagem consegue comprar essa matéria prima comum em qualquer loja que trabalhe com itens mágicos, ou pode conseguir esses itens com trocas e negociações.
Usando este método, eu costumo conceder uma determinada quantia de matéria prima mágica durante as aventuras, quando os personagens derrotam monstros, encontram tesouros ou em locais específicos. Podem ser materiais como pó de fada, enxofre infernal, ossos de mortos-vivos, casca de Mímico, etc. Certa vez um grupo conseguiu uma enorme quantidade de matéria prima em um cemitério de dragões.
O personagem usará uma determinada quantidade de matéria prima para criar um item mágico. Mas neste ponto, acho que personagens que já conjuram e controlam a magia devem realizar um processo diferente daqueles que não o fazem, e então as regras para criação de itens difere entre personagens que usam magia para aqueles que não usam.
Personagens que usam magia fazem o item de forma mais barata, pois não precisam de tanta matéria prima mágica, usando sua própria energia como parte do processo. Porém, como precisam se concentrar e realizar um ritual, eles gastam mais tempo e precisam realizar o processo com mais precisão, ou seja, a dificuldade no teste de criação é mais alta.
Já os personagens que não usam magias pagam mais caro para criar itens mágicos. Eles compensam a falta de magia natural usando mais matéria prima, mas como não precisam se concentrar, conseguem criar o item em menos tempo e com menos dificuldade.
Na tabela a seguir, mostro a base da criação de itens mágicos do antigo Zênite, deixando aqui como sugestão para suas aventuras:
A Fórmula
Custo:
Determina quanto será gasto em matéria prima mágica para criação do item mágico em relação a seu preço de mercado (aquele descrito no livro). Não é necessário nenhum outro pré-requisito para criação dos itens mágicos, exceto aqueles que como já sugerimos, o Mestre pode considerar mais raros e exigir algum componente especial em sua formulação.
Nem todos os sistemas apresentam uma tabela com os preços dos itens mágicos. Se não for possível determinar estes valores, use referências de acordo com o poder do item mágico e seu suposto valor de mercado, algo como: Um item mágico com habilidades simples e comuns tem um valor baixo de mercado, e talvez custe o mesmo que uma montaria especial ou carruagem. Itens poderosos com habilidades únicas custam tanto ou mais que uma casa em um reino nobre ou ainda mais.
Tempo:
Quantas horas são necessárias para a criação do item. Normalmente, permito que os personagens dediquem até 2 horas por dia para outras tarefas mesmo quando estão se aventurando, o que inclui aprender novas magias, treinar técnicas de combate e também criar itens. Apenas em situações muito adversas (entrando em Mordor?!) o personagem não teria esse tempo disponível a cada dia.
Também costumo permitir que o personagem se dedique mais ao trabalho, caso queira, dormindo menos, e realizando testes de fadiga no dia seguinte. Acredito que assim seja melhor do que simplesmente dizer “o personagem não pode apressar o processo”, afinal a construção de um item pode ter certa urgência, e o jogador pode achar mais válido ficar com penalidades de cansaço para acelerar o processo de criação. Isso cria situações de jogo muito interessastes. E claro, em um dia livre ele pode ficar 6, 8, 10 horas trabalhando para terminar o mais rápido possível.
Mesmo que o sistema usado não use ouro (ou use em outra escala), é possível usar a proporção sugerida independentemente do sistema financeiro do cenário sendo jogado.
Experiência:
Ao longo dos anos aprendi que XP é algo sagrado para o jogador, e mexer com ela requer muito cuidado. Não aconselho altos custos de experiência para quase nada, muito menos para criação de itens, que de certa forma, são descartáveis. Por isso em Zênite coloquei o custo de experiência fixo em apenas 50 de XP. Pode parecer muito pouco, e na verdade é. A ideia é trazer um custo mínimo, que indique que o personagem está concedendo parte de si mesmo para criação do item e ao mesmo tempo ajudar no equilíbrio da escala de criação de itens fracos e fortes. Isso porque, nos níveis baixos, esses 50 pontos de XP impediriam o personagem de produzir itens fracos em larga escala, mas em níveis mais altos, onde a diferença de experiência para passar de um nível para o outro aumenta, esse baixo valor de XP permite que os personagens veteranos tentem criar itens com facilidade sem obrigatoriamente deixar de evoluir para tal.
Dificuldade:
A não ser que você jogue um sistema que tenha especificamente uma perícia própria para criação de itens mágicos, aconselho a usar o nível do personagem como base para o teste de criação. Lembre-se que ao falhar no teste, o personagem perde matéria prima, tempo e um pouco de experiência, então este teste deve ser pouco afetado por fatores externos. Obviamente um personagem de nível baixo dificilmente será capaz de criar um item mágico caro, assim como personagens de nível alto podem criar itens mais simples com dificuldade mínima.
Nota: As regras sugeridas aqui fazem parte de uma plano muito maior. A criação de itens mágicos é um assunto vasto e complexo, e poderia render (e rende) livros inteiros sobre o assunto. Ela não cobre todos detalhes e especificações, e nuances que podem existir para criação de itens mágicos distintos e talvez nem sempre seja aplicável a sua aventura. Trago apenas uma sugestão de como permitir que seus jogadores criem itens em sua aventura. Meus resultados foram bons. Se a regra não puder lhe ajudar, espero que pelo menos os conceitos usados lhe sirvam para abrir novas oportunidades (e parar com essa história de que tudo “é o mago”).
Mas espera um pouco. Está faltando algo.
Ei Bugaboo, não vai se meter nessa matéria? Não quer criar itens mágicos?!
Ahhhh claro.
Bugaboo
30/01/2018 at 3:35 pm
Boas dicas Bugaboo! Recomendo também a leitura da criação de itens do D&D 4E que é super simples e funcional. Incrível como a edição mais criticada de D&D é a que possui as melhores regras para criação de itens, monstros, PDMs, encontros, divisão de XP e o melhor e mais didático livro do mestre. Mesmo para os que não gostam do sistema, e não possuem preconceitos, vale a pena conferir