Uma Dungeon para os hexágonos do mapa de suas campanha.

Nestes últimos meses venho conduzindo uma campanha de fantasia sombria com foco no estilo hexcrawl. O sistema de jogo é de minha autoria e estamos entrando na 3ª temporada de testes, mas outro dia eu falo do meu sistema…. Voltemos ao Hexcrawl.

Eu fiz uma penca de tabelas para me auxiliar na geração do mundo em tempo de execução, ou seja, enquanto os dados rolam. E tudo tem funcionado muito bem, obrigado! Os hexágonos estão sendo bem preenchidos, na verdade preencher hexágonos virou um hobby para mim, um hobby dentro do hobby. Porém, uma coisa vinha me incomodando um pouco no meu Hexcrawl: As dungeons.

Cadernos com folhas quadriculadas A4 e A5, para as dungeons. Valeram cada centavo!

Mini-Dungeons maravilhosas

As tabelas me poupam da preparação prévia, mas quando o grupo explorava um hexágono novo e os dados me diziam que eles encontrariam uma dungeon, o bixo pegava pro meu lado. Minhas tabelas me fornecem o tipo de dungeon, sua origem, seus habitantes, seus tesouros, mas não seu mapa. Eu sei que existem vários geradores de mapas de dungeons por ai, mas depois de ver uma penca de One Page Dungeons iradíssimas, eu resolvi que criaria as minhas próprias.

Hoje eu vou compartilhar uma das minhas mini-dungeons com você e talvez te incentivar a fazer as suas próprias!

Dungeons reaproveitáveis

Eu comprei uns 6 cadernos de folhas quadriculadas (R$1,00 cada um na Kalunga) só para desenhar pequenas dungeons. Assim, quando os jogadores se deparam com uma dungeon inesperada, eu apenas saco uma do meu repertório conforme o bioma do hexágono e pronto!

Apesar disso, eu considerei que seria mais interessante se algumas dungeons fossem reaproveitáveis na mesma campanha, para criar uma sensação de conectividade e plantar sementes de mistério na narrativa. Foi assim que nasceram as Árvores Sangrentas , que abrigam mini-dungeons sob suas raízes mortais e existem aos montes pelo mundo.

 

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A lenda das Árvores Sangrentas

Ninguém entende completamente o estas árvores são, ainda mais com toda a superstição e crendice popular que gira em torno delas. As modas de viola caipira falam que elas são vivas e adoradas por monstros, já os poemas dos menestréis aludem aos segredos mágicos escondidos sob suas raízes. Aventureiros contam bravatas sobre suas aventuras, mas somente os loucos inventariam histórias sobre tais árvores, pois segundo os padres, isso dá muito azar e atrai mau agouro.

Seu nome é Árvore Sangrenta, por conta dos relatos sobre desgraças e catástrofes sem sentido que acontecem ao seu redor. Muitos são os relatos de sumiços, suicídios e até sacrifícios rituais em torno destas árvores e a superstição rola solta. Outro ponto nebuloso é a forma como suas raízes crescem além do normal e parecem se mover sozinhas quando não há testemunhas.

Fato é que existem várias árvores desta estirpe no mundo e você pode até adicioná-las às suas tabelas de encontros aleatórios fantásticos. Elas podem variar de tamanho e espécie, mas continuam sendo árvores malignas ancestrais. Elas não são inteligentes como os humanos, mas possuem uma malícia silenciosa, sádica e macabra.

Ninguém assume a existências destas árvores, mas seja por meio de cantigas infantis, poemas de bardos ou boatos de taverna, todo mundo já ouviu a sua lenda sinistra.

Rolando e definindo verdades

As árvores Sangrentas possuem uma origem, um objetivo, um segredo e talvez uma fraqueza. Isso pode ser compartilhado entre todas ou completamente individualizado…você decide isso, mas todas elas possuem um séquito de criaturas canibais que a protegem e zelam pelo seu objetivo. Estas criaturas são consideradas seus frutos! Sim! Estas árvores malditas talvez possuam frutos ou filhos.

Para deixar a coisa mais maleável, você pode consultar as tabelas a seguir para definir a origemobjetivo, segredo e fraqueza destas árvores em sua campanha.

Tabela 1 – Origem

1 Entes consumidos pelo ódio acabaram retornando ao mundo como mortos-vivos malignos.
2 Oriundas do inferno, elas são vegetais demoníacos plantadas milênios atrás por druidas loucos de eras remotas.
3 Espíritos das grandes Deusas-bruxas foram aprisionados nas árvores, amaldiçoadas por toda a eternidade.
4 Nascidas do solo corrompido pelo sangue dos inocentes e pela sede de vingança dos assassinados na região.
5 Indicam o ressurgimento de um poder antigo e perigoso, como um reis-bruxo, arque-lich ou lorde vampiro.
6 Parasitas alienígenas que encontraram na madeira destas árvores o meio propício para sua sobrevivência.

Tabela 2 – Objetivo

1 Sugar a vida do solo e tornar a região ao seu redor numa área sombria e devastada.
2 Atrair pessoas para que seus “filhos” possam se alimentar de seu sangue. As pessoas não morrem, mas voltam apáticas e sem lembranças.
3 Beber o sangue dos inocentes! Seus “filhos” sequestram animais e pessoas para que seus apetites sangrentos sejam satisfeitos.
4 Causar a discórdia e semear sentimentos suicidas, homicidas e sádicos telepaticamente durante os sonhos das pessoas.
5 Profetizar e recrutar seguidores para alguma força sombria, obscena e tão antiga quanto o próprio mal.
6 Gerar seus frutos-vivos. Seus filhos são gerados a partir do sangue drenado pelas suas maliciosas e traiçoeiras raízes

Tabela 3 – Segredo

1 Esconde um fruto pulsante no subsolo, é o seu coração maligno. Nele reside o espirito de todas as suas vítimas e destruí-lo causará sua morte.
2 Seus “filhos” já foram pessoas, vítimas no passado. Não há como reconhecê-los, mas uma pilha com seus pertences se encontra no subsolo. Destruir os itens matará os “filhos”.
3 Uma criatura catatônica está aprisionada nas raízes e suas energias foram drenadas pela árvore por mais de duzentos anos.
4 Existe um emaranhado de raízes formando um portal de mão-única no subsolo e é de lá que vem os “filhos”.
5 Textos esculpidos nas paredes do subsolo revelam a origem da árvore. Alguém no passado tentou destruí-la, mas o máximo que conseguiu foi registrar como.
6 Uma raríssima flor de lótus multi-colorida brota no subsolo. A planta é magica, se alimenta da seiva sombria da árvore e é adorada pelos “Filhos”.

 

Tabela 4 – Fraqueza

1 Existe uma lua cheia no ano, onde a árvore fica especialmente vulnerável. Nesta noite ela pode ser queimada.
2 Água benta pode erradicar a árvore, caso seja derramada sobre a plataforma na área 5. Isso causará um incêndio mágico nas raízes e em 1d4 minutos os aventureiros serão intoxicados com a fumaça.
3 Um ritual realizado por 3 ou mais sacerdotes na área 5 fará a árvore adormecer por 1d10 décadas, mas um dos sacerdotes será fulminado após o processo.
4 A magia Dissipar o Mal pode deixar a árvore dormente por 1d6 anos (chance de 5% por nível do conjurador). Um resultado 01% na rolagem aniquilará a árvore.
5 O canto de crianças pode enlouquecer a árvore. Neste estado ela perde suas imunidades, os ataque de seus “filhos” e raízes são defendidos com vantagem, mas as crianças serão acometidas de pesadelos por toda a vida, desenvolvendo doenças mentais.
6 A árvore é um monstro de 10 DV, que ataca com 5 raízes, é imune a armas normais, magias de 3º círculo ou menos e fogo. Seus PV só são reduzidos com ataques direcionados ao seu tronco.

Filhos ou frutos? Canibais com certeza!

Uma nota sobre os perigos

As Árvores Sangrentas representam um grande perigo aos personagens dos jogadores. Suas raízes são longas e ágeis como chicotes, sua madeira é imune a fogo e outras substâncias corrosivas e seus “filhos” são criaturas implacáveis de mentalidade sádica e cruel, que atacam com clavas e mordidas. Seu tronco ou raízes possui algum tipo de entrada para o seu interior e subsolo, que são igualmente perigosos. Andar dentro da árvore somatiza as dificuldades comuns à exploração de cavernas apertadas com os  tremores de terra e armadilhas  antinaturais orquestradas pela senciência maligna da árvore.

Aqui você deve adequar a dificuldade dos perigos à sua campanha. Como eu gosto muito de The Black Hack, irei deixar aqui estatísticas para este jogo, mas acho que aqui fica o seu dever de casa: adaptar para o seu jogo. Os “filhos” são criaturas humanoides pequenas, ferozes e ágeis. Atacam impiedosamente e preferem emboscadas e ataques em bando. Já as raízes na superfície se manifestam apenas em último caso, tentando manter a atmosfera de suspense e mistério sem revelar sua existência, até que possam atacar e estrangular os personagens dos jogadores.

A mini-dungeon

Agora que já vimos o que suficiente para inserirmos as Árvores Sangrentas em jogo, vamos a um pequeno mapa de dungeon. Algo para lhe inspirar, pois nem todas as árvores devem criar complexos iguais. Fique a vontade para editar e reformular tudo, conforme seu bem entender.

 

E eis que eu finalmente voltei a desenhar!

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1) Descendo no escuro

O caminho para o interior da árvore é apertado e os túneis também (1,5m de altura e largura), o que dificulta o combate e impossibilita o uso de armas maiores que uma espada. A descida é inclinada e alguns degraus naturais se formam na terra fofa. O local todo é quente e úmido, o ar é pesado e uma sensação claustrofóbica acomete aos invasores. É possível ver partes das raízes da árvore saindo pelas paredes e teto e gotas de um líquido negro e viscoso caem do teto esporadicamente, é a seiva corrosiva da árvore. Após alguns metros, a descida se abre em uma área mais larga, que aponta 3 caminhos distintos, mas uma corrente de ar apaga as tochas do grupo antes de poderem ver mais detalhes.

2) As cortinas da morte

Seguindo por uma inclinada descida de uns 2 metros de profundidade, eis que se abre uma câmara cheia de raízes penduradas no teto. O volume é maior do que em todos os outros lugares, chegando a parecerem cortinas penduradas. Ruídos de carne sendo despedaçada e gemidos de dor revelam que alguma criatura está sendo devorada viva. Luzes de tochas e lanternas não revelam muito por conta das raízes, mas se as “cortinas” forem removidas ou empurradas, os 5 “filhos” pararão seu banquete e correrão para o ataque. A cada rodada de combate, dois personagens serão atacados por 1 raiz cada.

  • Um cachorro está sendo devorado pelas criaturas, ele não tem muitas chances de sobreviver e morrerá em 3 rodadas.
  • Se o cachorro for salvo, os personagens ganharão a amizade da Banshee da área 3, pois este animal era seu cão de estimação, quando ela era viva.

3) Um abismo chama outro

A descida é estreita e se prolonga por uns 3 metros, até que desemboca em uma câmara mais larga e com uma boa corrente de ar. Nesta câmara existe uma fenda de 3 metros no chão que gera uma queda de mais de 20 metros (pode ser um novo andar da dungeon). Desta fenda é que vem a corrente de ar e com ela sussurros sinistros. Olhar na fenda ou jogar uma tocha lá despertará a fúria de um fantasma atormentado pela árvore, uma banshee com aparência de criança, capaz de matar a todos com um único grito!

  • Um vento apaga as tochas e sussurros mentais ou ilusões fazem com que um jogador ataque um aliado, caso não evite o engodo mental.
  • A Banshee não atacará caso o seu cachorro seja salvo na área 2. Ela revelará sua história (pode ser um gancho de aventura) e se cuidarem do cão, ela poderá aparecer uma vez por ano, para salvar o grupo de algum perigo.
  • Ao fundo da câmara existe uma passagem escondida, são pedras toscamente empilhadas com o claro objetivo de fechar uma passagem.
  • Esta passagem pode levar até o fundo da fenda ou a outro andar mais profundo, isso fica a seu critério.

4) O ninho do capeta

Pedras empilhadas toscamente parecem esconder uma câmara na esquina do corredor. Remove-las irá alertar aos “filhos” do outro lado, que armarão uma emboscada improvisada. A câmara possui diversos buracos no chão e nas paredes, são as alcovas onde os “filhos” parecem descansar, se é que fazem isso. 2d6 “filhos” estão escondidos nestes buracos e atacarão assim que o primeiro personagem alcance o centro da câmara ou o último personagem caso eles não investiguem o local e apenas virem as costas.

  • Itens sem valor e pertences de antigas vítimas podem ser encontrados nas alcovas. Uma busca completa revela a presença de uma mochila velha com 1 pergaminho de magia divina (2º círculo) e uma bolsa com 6d6 moedas de ouro.
  • Uma busca casual tem 35% de chances de revelar estas coisas.

5) O segredo da árvore

Nesta vasta câmara ficará o segredo que você rolou na Tabela 3 – Segredo. Protuberâncias nas paredes lembram rostos humanos e no centro desta câmara fica uma plataforma natural elevada a uns 1,5 metros do chão, onde fica o segredo. A câmara possui uns 6 metros de altura e é o local mais assustador da dungeon. Quando os aventureiros entram neste lugar são atacados por um forte tremor… A árvore teme por seu segredo e um grito estridente monstruoso emana de suas raízes!

  • 1d6 raízes surgem do teto e do chão quando alguém sobe na plataforma
  • A cada rodada existe 25% de chance que 1d4 faces nas paredes cuspam um líquido negro, quente e corrosivo (1d6 de dano e reduz o dado de uso de escudos e armaduras).
  • A cada rodada existe 25% de chance que um tremor aconteça novamente (1d6 de dano, ou metade se houver uma evasão).
  • Na segunda rodada, da entrada elevada ao norte, surgem 2d6 “filhos” desesperados para proteger o segredo.
  • Após 5 rodadas, o barulho irá atrair algum monstro da área 6 (role 1d4: (1) 1d6 Morcegos vampiros gigantes (2) Verme de carniça (3) Centopeia mortal (4) 1d4 Ghouls

6) O além

Os tremores de terra ao longo dos anos acabaran abrindo uma nova área no subterrâneo. Esta câmara não foi escavada pela árvore e suas raízes não são uma ameaça aqui. Na verdade, esta área é um ponto de ligação entre esta dungeon e qualquer outra que você queira usar. Se não tiver nada em mente, pode apenas dizer que o caminho está obstruído ou estreito de mais para uma pessoa passar, mas unir dungeons faz do mundo um lugar “menor” e mais interessante.

  • Esta câmara possui duas plataformas elevadas a uns 2 metros do chão.
  • Como os “filhos” não ficam longe do alcance das raízes de sua “mãe”, não entram nesta área,  o que a torna um bom local para um repouso.
  • Mas lembre-se, se for usar outra dungeon para continuar a exploração, talvez algum perigo possa rastejar no meio da noite e atacar a galera!

Tabela 5 – Monstros

MONSTRO DV AÇÕES E PODERES ESPECIAIS
Morcego vampiro gigante 1 dano de 1d6 no momento seguinte ao ataque.
Centopeia mortal 1 Mordida (0) mais teste de CON ou ‘FdA’ – tem apenas 1-2 PV.
Raízes da árvore 1 1d6 de dano (alcance próximo) e enforcamento se causar mais de 3. Um alvo enforcado se livra com um teste de FOR ou sofre 5 de dano.
Verme de carniça 2 Mordida (1) + 6 Tentáculos (0) + Teste de CON ou ficar Paralisado.
Ghoul 2 2 Garras (1d3) + 1 Mordida (1d4) + Teste de CON ou ficar Paralisado.
“Filhos” 2 1 Clava (1d6) e 1 mordida (1d4). Se 3 ou mais atacarem o mesmo alvo, ele tem desvantagem na sua defesa.

Sua pele laranja e olhos hipnóticos são bizarros, assim como suas nojentas pústulas cascudas espalhadas por todo o corpo. Enxergam totalmente no escuro e possuem imunidade a fogo.

Banshee infantil 4 Grito exige um teste de CON ou Paralisia por 2d6 momentos.

 

A arte de Sean Äaberg retrata bem a crendice popular

Destruindo o mal pela raíz

Se os jogadores conseguiram a façanha de anular a árvore explorando sua fraqueza, as comunidades da região cantarão o seus nomes por gerações. Os sacerdotes oferecerão dádivas e bençãos, chefes do povo garantirão livre passagem, hospedagem e mantimentos sempre que precisarem e nobres locais podem conceder uma parte de suas terras, um valor razoável em ouro ou até mesmo uma de suas filhas em casamento.

Independente de quaisquer benefícios adquiridos, a vida dos personagens nunca mais será a mesma. Outras árvores sangrentas automaticamente sentirão as dores de sua “irmã” e reconhecerão os personagens como inimigos detestáveis. Dependendo da origem da árvore, alguém pode ficar furioso e buscar vingança contra os aventureiros, mas nem tudo é desgraça! A banshee pode se tornar uma aliada do grupo e divindades locais podem presenteá-los com uma benção especial, talvez um nível extra, um item mágico, a capacidade de sentir a presença destas árvores, 1 amuleto que garante vantagem em testes específicos etc. Seja criativo!

 

Espero que tenha curtido essa mini-dungeon e que cheuge a usar algo deste post em suas campanhas.

É isso ai pessoal, vou ficando por aqui.

Abraços!


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