Arte original da capa por Moniek Schilder
Faz um tempo que acompanho alguns debates sobre testes de atributos em D&D. Geralmente o papo fala sobre sua origem, relevância e necessidade nas várias edições de D&D. Hoje eu quero questionar uma coisa para aqueles que, assim como eu, jogam sem testes de atributo:
Qual a necessidade de termos atributos se não vamos testá-los?
Eu sei que os seis atributos são icônicos do D&D e já estão “sacramentados no meu coração”. Porém, eu joguei a primeira temporada de Rules Cyclobeer sem testes de atributos e terminei me questionando sobre a real necessidade dos atributos no jogo.
Me pareceu muito mais prático apenas usar uma ficha igual de monstro para os jogadores e seguir o jogo. Vamos analisar um pouco como seria o jogo sem atributos e a formas de retirá-los sem prejuízo do jogo?
Eu vi 2 pontos que talvez justifiquem manter os atributos em mesas que não usam testes de atributos.
Atributos geram modificadores
Relendo meu D&Dzinho da GROW os atributos me foram apresentados como meros geradores de modificadores, pois o livreto não tinha regra de testes de atributos. Basicamente você colocava aqueles atributos para causar mais dano, acertar mais ataques, resistir melhor a magias, falar mais idiomas, ter melhores reações sociais e até passar de nível mais rápido.
Essa abordagem se mantém em todas as edições de D&D, inclusive naquelas onde os testes de atributo não são core do sistema, mas apenas regra pontual ou opcional.
Atributos mensuram as chances de sucesso
Alguns mestres que jogam sem testes de atributos dizem que usam os atributos como régua para determinar sucesso em ações ou limitar tentativas absurdas, como um guerreiro de full plate querendo equilibrar-se sobre a corda do varal. Eu vejo bastante sentido neste tipo de julgamento, embora ache que os limites deveriam vir dos nichos de personagens e não dos atributos.
Jogar sem atributos quebraria o jogo?
Creio que não! Monstros não tem atributos nas versões antigas e isso nunca os atrapalhou em nada. Realmente acho que os jogadores poderiam ter fichas simplificadas como as dos monstros, adicionando apenas equipamentos e features de classes. Alias, daria até para calcular quanto de XP um PJ valeria se fosse derrotado, da mesma forma que um monstro.
Se o sistema não for fortemente acoplado aos atributos, com testes e perícias baseadas neles, não precisaremos deles pra nada.
O que acontece se tirarmos os atributos do jogo?
Nada! Não precisamos retirar os atributos do jogo, mas seria totalmente possível fazê-lo sem que o sistema de jogo sofresse com isso. Vamos ver os 3 pilares do D&D sob o prisma de um jogo sem atributos.
Combate: Uma vez que é totalmente possível realizar o combate entre monstros sem atributos, entendo que os atributos não farão falta nos combates dos jogadores. Talvez os modificadores façam, mas poderíamos gerá-los de outras formas caso sentíssemos muita falta deles.
Exploração: Tendo em vista que sem perícias e testes de atributos, teremos que usar outras regras para explorações. A chance para se perder, achar água, seguir rastros e fugir de inimigos não precisa ser baseada em atributos, só olhar na Rules Cyclopedia. Acho que alguma mecânica de nicho resolveria isso muito bem caso você não goste de chances fixas. Aquelas regras de “X chances em 6” são ótimas e você poderia levar em conta os nichos assim.
Interação Social: Aqui nem vale a pena perder tempo. Jogo OSR já não tem mecânicas para isso mesmo. Carisma faz falta zero aqui, já que seus modificadores tem usos diferentes de mandar uma lábia em alguém. Jogador OSR tem que fazer no gogó e de improviso.
Diferenciando personagens de nicho igual
Acho que bastaria usar características descritivas para gerar personagens diferentes, mas muitos sentem a necessidade de diferenças mecânicas entre personagens de mesma classe para não se sentirem “clones” uns dos outros.
Em jogos modernos temos listas de talentos e características de classe opcionais, mas em jogos OSR contamos apenas com os atributos e equipamentos. Neste caso não tem muito o que fazer, embora não acredite que apenas atributos diferentes definiriam a linha que separa um viking berserker de um samurai contemplativo.
Como opção o mestre poderia deixar os jogadores introduzirem algum feature distintivo em seus personagens. O samurai poderia iniciar o jogo com uma espada de qualidade maior e o viking poderia saber lutar com 2 machados sem penalidade. Dai é só argumentar e ponderar com bom senso.
Conclusão
Acho que os atributos são totalmente desnecessários se você não os testar ou tiver perícias baseadas neles. Se seu grupo percebe que 2 personagens de classes, habilidades e equipamentos iguais podem ser diferentes entre si, os atributos não farão falta.
Mas acho que retirá-los do jogo pode ser traumático para jogadores que tem dificuldade de abstração e que precisam de réguas para medir personagens. Nestes casos eu usaria algo como aspectos do fate ou feats mesmo.
Isso tudo me deu ideias para um joguinho compativel com BX, mas preciso acabar o CMB ainda!
E ai? O que você acha dessa viagem toda? Se não usarmos testes de atributos ainda precisaremos deles no jogo? Uma ficha compacta como as de monstros serviria para os jogadores?
Abração!
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10/02/2020 at 3:33 pm
Interessante essa linha de pensamento, quando comecei a jogar RPG eu e meus colegas tínhamos um sistema próprio, o qual tenho até hoje (ajustado é claro), onde não há atributos ou classes, apenas as características dos personagens e suas habilidades
11/02/2020 at 5:02 pm
Muito interessante , mas certamente alguém irá perguntar como fazer para esquivar de uma armadilha, forçar uma porta ou resistir a um veneno. Como você faria isso ?
15/02/2020 at 10:20 pm
Nas versões antigas de D&D tinham varias coisas que eram feitas com base em “x chances em 6”, ou seja, vc rola 1d6 e se cair x ou menos vc acerta. Poderiamos facilmente usar isso para todos os testes.
Evitar armadilha: 2 em 6, ou 3 em 6 se vc for ladino ou agil ou tenha um sexto sentido
Arrombar portas: 2 em 6, ou 3 em 6 se vc for brutamontes
Resistir veneno: Eu sou adepto do “bebeu morreu”, mas poderia seguir na mesma vibe. 2 em 6, se for anão 3 em 6 por exemplo.
24/02/2020 at 7:07 pm
Eu utilizo um sistema próprio aonde o PJ simplesmente rola o dado conforme a dificuldade atribuída pelo mestre por exemplo:
Um teste de inteligência um mestre poderia rolar 1 D20 contra 1 d 6 do PJ
(Considerando assim como um teste difícil. )
30/03/2023 at 5:42 pm
Kids and Dragons (disponível gratuitamente na internet) possui mecânica baseada em D&D, mas sem uso de atributos ou perícias. A diferença é que ele foi pensado para um jogo sem avanço e é possível jogar normalmente. Se pensarmos em avanço de personagens para uma suposta campanha, recomendo algumas modificações.